CANDOMBLÉ DE ANGOLA
A "nação"
Angola, de origem Banto, adotou o panteão dos orixás iorubás (embora os chame
pelos nomes de seus esquecidos inkisis, divindades bantos, assim como
incorporou muitas das práticas iniciáticas da nação queto.
Sua linguagem ritual,
também intraduzível, originou-se predominantemente das línguas quimbundo e
quicongo.
Nesta "nação",
tem fundamental importância o culto dos caboclos, que são espíritos de índios,
considerados pelos antigos africanos como sendo os verdadeiros ancestrais
brasileiros, portanto os que são dignos de culto no novo território a que foram
confinados pela escravidão.
O candomblé de caboclo é
uma modalidade da nação angola, centrado no culto exclusivo dos antepassados
indígenas.
Foram provavelmente o
candomblé angola e o de caboclo que deram origem à umbanda.
Há outras nações menores
de origem banto, como a congo e a cambinda, hoje quase inteiramente absorvidas
pela nação angola.
O Deus supremo e Criador
é Nzambi ou Nzambi Mpungu; abaixo dele estão os Jinkisi/Minkisi, divindades do
Panteão Bantu.
Essas divindades se
assemelham a Olorun e Orishás da Mitologia Yorubá, e Olorum e Orixá do
Candomblé Ketu.
Os principais Minkisi
são:
Aluvaiá,
Bombo Njila,
Pambu Njila:
Intermediário entre os
seres humanos e o outros Jinkice (cf. Exú (orixá)).
Nkosi: Senhor dos
Caminhos, das estradas de terra
Mukumbe, Biolê, Buré:
qualidades ou caminhos desse Nkisi
Ngunzu: engloba as
energias dos caçadores de animais, pastores, criadores de gado e daqueles que
vivem embrenhados nas profundezas das matas, dominando as partes onde o sol não
penetra.
Kabila: o caçador pastor.
O que cuida dos rebanhos da floresta.
Mutalambô,
Lembaranguange: caçador, vive em florestas e montanhas; deus de comida
abundante.
Gongobira: caçador jovem
e pescador.
Mutakalambô: tem o
domínio das partes mais profundas e densas das florestas, onde o Sol não
alcança o solo por não penetrar pela copa das árvores.
Katendê: Senhor das
Jinsaba (folhas). Conhece os segredos das ervas medicinais.
Nzazi, Loango: São o
próprio raio.
Kavungo, Kafungê,
Kingongo: deus de saúde e morte.
Nsumbu - Senhor da terra,
também chamado de Ntoto pelo povo de Kongo.
Hongolo ou Angorô:
auxilia a comunicação entre os seres humanos e as divindades.
Kitembo: Rei de Angola.
Senhor do tempo e estações.
Kaiangu: têm o domínio
sobre o fogo.
Matamba, Bamburussenda,
Nunvurucemavula: qualidades ou caminhos de Kaiangu
Kisimbi, Samba_Nkice: a
grande mãe; deusa de lagos e rios.
Ndanda Lunda: Senhora da
fertilidade, e da Lua, muito confundida com Hongolo e Kisimbi.
Kaitumbá, Mikaiá,
Kokueto: deusa do oceano.
Nzumbarandá: a mais velha
das Nkisi
Nwunji: Senhora da
justiça. Representa a felicidade de juventude e toma conta dos filhos
recolhidos.
Lembá Dilê,
Lembarenganga, Jakatamba, Kassuté Lembá, Gangaiobanda: conectado à criação do
mundo.
Ritual
Na Angola, os sacramentos
são:
1 - Massangá: Ritual de
batismo de água doce (menha), na cabeça (mutue), do iniciado (ndumbi),
usando-se ainda o kezu (Obi).
2 - Nkudiá Mutuè: (Bori)
- ritual de colocação de forças (Kalla ou Ngunzu (Angola) = Asé (Axé) = Muki (Congo)),
através do sangue (menga) de pequenos animais.
3 - Nguecè Benguè
Kamutué: ritual de raspagem, vulgarmente chamado de feitura de santo.
4 - Nguecè Kamuxi Muvu:
Ritual de obrigação de 1 ano.
5 - Nguecè Katàtu Muvu:
Ritual de obrigação de 3 anos (Nguece = obrigação), nessa obrigação, faz-se o
ritual de mudança de grau de santo.
6 - Nguecè Katuno Muvu:
Ritual de obrigação de 5 anos, preparação quase que idêntica a de um ano, só
que acompanhada de muitas frutas.
7 - Nguecè Kassambá Muvu:
ritual de obrigação de 7 anos, quando o iniciado receberá seu cargo, passado na
vista do público, sendo elevado ao grau de Tata Nkisi (Zelador) ou Mametu Nkisi
(Zeladora).
As obrigações, são de
praxe para os rodantes, porque Kota (ekedi) e Kambondo (Ogã), já recebem seus
cargos na feitura, portanto já nascem com suas ferramentas de trabalho, dão
suas obrigações para aprimorar seus conhecimentos.
Em Angola, quem passa
cargo são os enredos de Dandalunda. Isto é, não é preciso ser filho de
Dandalunda, mas é ela quem autoriza aquela pessoa a receber o cargo.
Após 7 anos de
obrigações, se renovarão a cada ano com rito de obi ou borí, conforme o caso,
repetindo-se as obrigações maiores de 7 em 7 anos para renovar e conservar o
indivíduo forte, transformando-o em Kukala Ni Nguzu- Um ser forte.
Kunha Kele: Sacramento
realizado 3 meses e 21 dias após a feitura (tirada de kele), quando o santo
soltará a Kuzuela = Ilá.
Ordem de barco (sequência
das pessoas recolhidas juntas para iniciação) na Angola
1º - Kamoxi,
2º - kaiari,
3º - katatu,
4º - Kakuanam,
5º - kakatuno,
6º - Kassagulu,
7º - Kassambà.
Na hierarquia de Angola o
cargo de maior importância e responsabilidade são: é mais frequente se dizer
Tata Nkisi (homem) ou Mametu Nkisi (mulher).
O início e orgulho de uma nação
No ano de 1881, em Salvador – BA, nasce Manuel Bernardino da Paixão.
Em 1919, Bernardino iniciou-se na
Nação do Kongo, pelas mãos do
Muxikongo (designação das pessoas naturais do Kongo),
Manuel Nkosi, sacerdote iniciado na África.
E sua dijina era Ampumandezu. Quando Manuel Nkosi kufou (morreu),
Bernardino procurou sua amiga Maria Genoveva do Bonfim – Mam’etu Tuhenda
Nzambi, do Tumba Nsi (outra importante raiz de Candomblé de Angola) que era
mais conhecida como Maria Neném.
Foi com ela, que Bernardino tirou a Maku-a Mvumbi (Mão do Morto), pois
não havia outras casas de culto Kongo em Salvador.
Como o culto de Angola possui muitas diretrizes do Kongo, acredita-se
que ele tenha escolhido o Tumba Nsi por este motivo.
Maria Neném era filha-de-santo de Roberto Barros Reis, escravo angolano,
de propriedade da família Barros Reis, que lhe emprestou o nome pelo qual era
conhecido.
A cerimônia de Maku-a-Mvumbi, a qual Bernardino se submeteu, coincidiu
com a iniciação de Manoel Ciriaco de Jesus, nascido em 08 de agosto de 1892,
também na Bahia.
A partir daí, Bernardino e Ciriaco se tornaram amigos. Ciriaco, anos
mais tarde, após o falecimento de seu irmão-de-santo mais velho, Manuel
Kambambi, que na época tinha casa aberta na Bahia, o sucedeu no terreiro que
hoje é conhecido por Tumba Juncara (outra importante raiz de Candomblé de
Angola).
Com o passar do tempo, Bernardino já muito famoso, fundou o Inzo Manzo
Bandukenké (Bate Folha), situado na Mata Escura, em Salvador, Bahia.
O terreno onde está estabelecido o Candomblé, é cercado de árvores
centenárias e considerado o maior Terreiro do Brasil que, na época, foi
presenteado à Bamburusema (lansã), seu segundo mukixi, já que o primeiro era
gamgainbanda (Oxalá velho).
Logo, pelas origens de Manuel Nkosi, o Bate Folha é Kongo e, mantém o
Angola, por parte de Maria Neném.
No dia 04 de dezembro de 1929, Bernardino tirou seu primeiro barco, cujo
Rianga (1º Filho da casa), foi João Correia de Mello, que também era de Lemba
(Oxalá novo).
Tat’etu Ampumandezu iniciou cinco barcos: quatro na Mata-Escura e um na
casa da filha.
Nesses cinco barcos ele só fez dois filhos-de-santo homens: João Correia
de Mello (João Lessenge), que foi o primeiro e Bandanguame, do segundo barco.
O Bate Folha do Rio de Janeiro
Por volta de 1938, João Correia de Mello, conhecido como João Lessenge
(Lessengue), mudou-se para o Rio de Janeiro.
Ao chegar, Lessenge foi morar na Rua Navarro, no Catumbi. Trouxe em sua
companhia, alguns irmãos de santo, Mãe Ngukui, chegaram mais tarde em 1952
João Lessenge conheceu outras pessoas de santo, em sua maioria oriundas
da Bahia, passando então a participar dos rituais das diversas casas de
Candomblé, já existentes na cidade.
Teve como grande amigo e conselheiro, pai pequeno Virgílio Angorense,
daí houve uma grande afinidade e algumas liturgias assimiladas do Jeje.
No início dos anos 40, Lessenge comprou um terreno com aproximadamente
5.000 metros quadrados, no bairro Anchieta, fundando ali, o Inzo Kupapa Unsaba,
mais conhecido como Bate Folha do Rio de Janeiro.
Quando Bernardino faleceu, Tat’etu Lessenge foi escolhido para assumir a
casa, o Manzo Bandukenké, mas ele já havia fundado sua casa no Rio de Janeiro e
não pode assumir a responsabilidade, que foi passada a Bandanguamê, que era de
Kavungo.
O terreiro de Salvador é Bate Folha, porque o nome da fazenda que
Tat’etu Ampumandezu comprou para fixar a roça, tinha esse nome.
Já no Rio de Janeiro, Tat’etu Lessenge quis colocar um nome que desse
referência a casa onde foi iniciado e ficou Bate Folha também.
João Lessenge tirou doze barcos, sendo o primeiro em 26 de novembro de
1944, e o último em 08 de novembro de 1969.
No dia 29 de setembro de 1970, às 23:40h, morre João Lessenge, o senhor
do Bonfim de Anchieta.
Após o falecimento de Tat’etu Lessenge, em 1970, o Bate Folha do Rio de
Janeiro atravessou um prolongado luto.
Somente em 1972, em ocasião de Luvaiu (Cerimônia de Sucessão), que o Bate
Folha do Rio de Janeiro reabriu, sendo ali investida, no cargo como Mam’etu riá
Nkisi (Sacerdote Chefe), sua sobrinha e filha-de-santo, Mabeji – Floripes
Correia da Silva Gomes, tornando-se, herdeira de seu tio Lessenge.
Mam’etu Mabeji, baiana do bairro da Liberdade, chegou ao Rio de Janeiro
para residir com o seu tio João Lessenge em 19 de outubro de 1946 e iniciou-se
no Candomblé em 20 de abril de 1947.
Está à frente do Inzo Kupapa Unsaba, há 34 anos, promovendo e preservando
os ritos bantus e kongo, de um modo magistral.
Kigua ao povo do Bate Folha, à Mam’etu Mabeji. Kigua, também, àqueles
que com carinho e seriedade, contribuíram para a preservação dos ritos que
começaram a ser disseminados ou com Tat’etu Ampumandezu e Tat’etu Lessenge.
A Tat’etu Paulo Mutaua, Mam’etu Sissime, Mam’etu Sambadiamongo, Mam’etu
Kilu e tantos outros, que já não estão mais conosco.
E kigua aos que ainda mantém acesa a chama do Angola/Kongo, Mam’etu Maza
Kessy, Mam’etu Ofalamim.
E tantos outros que seria quase impossível citá-los, dado o tamanho que está
família se tornou.
Falar sobre essa raiz é falar sobre a história do Candomblé no Brasil.
Esta Ndanji (raiz) inestimável, não sentiu a necessidade de
“aportuguesar” as cantigas.
Sempre procurou se aprofundar no culto, e talvez por isso aqui houve
essa ketualização que ocorre em algumas casas.