Enigma da Menstruação
“Segundo os nagôs igbómìnà Ìrókò é um caçador por excelência e Ãbòyámã[1], sua irmã, a essência de uma terrível feiticeira (àjé).
Ambos, habitam as árvores que possuem o nome dos mesmos.
Sempre que Ìrókò saía à noite, para perseguir animais, depositava os apreendidos junto à imensa apáòká que havia próxima à entrada da floresta.
Tão logo se retirava do local para reiniciar a caçada, as Ìyá mi eléeiye se aproximavam dos animais abatidos e bebiam todo o sangue dos mesmos.
Era assim todas as vezes em que Ìrókò saía para caçar.
Ãbòyámã, sempre que Ìrókò retornava da caçada com animais totalmente dessangrados, ela indagava: ‘O que o leva a trazer somente animais sem sangue para nos alimentar?
Ìrókò respondia-lhe da mesma forma todos os dias: ‘Isso não lhe diz respeito.
Deixe de ser curiosa e se preocupe mais com os afazeres da casa, ao invés de se envolver em meus negócios’.
Isso é você quem diz.
Vou insistir na resposta todos as vezes que você voltar da caçada. Ìrókò em tom ríspido respondeu-lhe: ‘Água que não é de beber, deixe-a correr’.
Diante do tom áspero do seu irmão, Ãbòyámã calou-se, todavia tal procedimento aguçou com mais intensidade o desejo de desvendar o enigma.
Assim sendo, tão logo Ìrókò adormeceu, sua irmã, após fazer três pequenos furos na sacola em que carregava seus objetos de caça (àpò-dòho), encheu-o de cinzas.
No dia seguinte, ao alvorecer, Ìrókò, sem de nada desconfiar, pegou seus objetos de caça, colocou-os dento da sacola e seguiu em direção à floresta.
Ãbòyámã, que aguardava silenciosamente por esse momento, deu início ao seu plano e, sorrateiramente, começou a seguir a trilha deixada pelas cinzas que caiam do saco que continha os apetrechos de caça do seu irmão.
Alguns passos da entrada da floresta, Ãbòyámã observou que Ìrókò deixou sua sacola aos pés de uma imensa árvore e, em seguida, adentrou a mesma, impedindo dessa forma de continuar-lhe seguindo.
Ãbòyámã não esmoreceu.
A vontade de desvendar todo aquele mistério era muito mais forte.
Assim sendo, decidiu aguardar naquele local o retorno do seu irmão.
No final do dia, antes do anoitecer Ìrókò retornou do interior da floresta trazendo consigo os animais abatidos.
Depositou-os aos pés da imensa árvore propiciatória, onde havia deixado o saco em que guardava seus apetrechos de caça.
Horas depois, a escuridão tomou conta da floresta.
Ãbòyámã, continuando às ocultas, aguardava o momento em que seu irmão dessangraria os animais.
De repente, diversas aves emitindo gritos aterrorizantes começaram a revoar o topo da árvore onde os animais abatidos foram depositados.
Logo em seguida, Ãbòyámã estatelada ficou ao ouvir um das aves dirigir-se ao seu irmão: ‘Por que não vieste sozinho como das vezes anteriores?
Ìrókò respondeu: ‘Mas eu vim sozinho’. ‘Se tu vieste sozinho como dizes, quem é aquela mulher escondida por trás dos arbustos?’; pergunto a ave.
Ìrókò, ao ouvir tais palavras empalideceu.
Totalmente desconcertado, olhou em direção aos arbustos, entretanto, nada viu. ‘Eu não sei de qual mulher estás falando.
Não vejo ninguém por trás dos arbustos’; respondeu Ìrókò, olhando outra vez para o local de que ave havia falado. ‘Eu me refiro à Ãbòyámã, tua irmã’; disse a ave.
Continuando o diálogo, a ave pronunciou-se: ‘Ela o seguiu desde que saíste de casa para caçar.
Ela deseja saber o porquê dos animais, que você caça e leva para casa, não possuem sangue.
Você, que está oculta atrás dos arbustos, saia daí imediatamente e se apresente’; continuou misteriosamente a ave a falar.
Apavorada, Ãbòyámã sai de detrás dos arbustos.
Quando Ìrókò a vê, uma força estranha lança sua irmã aos pés da árvore do sacrifício. ‘Perdão, Senhoras dos Pássaros (Ìyá mi eléeiye).
Eu não sabia que o sangue era para as senhoras’; clamou Ãbòyámã. ‘Uma mulher indiscreta deprecia sua família.
Procedendo dessa forma, ela provou que não confia em você, tampouco o respeita.
Já que você deseja ver sangue, você verá em si mesma, pois o fluxo menstrual que não era eliminado por tua genitália, a partir de hoje, enquanto fores jovem, verás de trinta em trinta luas em si mesma’;pronunciou-se friamente a Senhora dos Pássaros”.
Bibliográfica: PENNA, Antonio dos Santos – “Mérìndilogun Kawrí” – “Os Dezesseis Búzios” – Paginas 140 e 141 – Produção Independente – Ano 2009 (Edição Revista e Ampliada) – ISBN 978-85-902226-4-4.
[1] “Mãe que protege e dá continuidade às plantas”. FICUS ELASTICA. Existe a crença entre os nagôs igbómìnà de que a aludida árvore, expele energia negativa e atrai o azar, servindo também, de moradia de espíritos errantes “èmí àrinkiri”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário